Depois de criar tantos projetos do zero, desde minhas startups até novos produtos e áreas inteiras dentro de outras empresas, decidi começar a compartilhar, pouco a pouco, os desafios e aprendizados que mais me marcaram. Começando pela Joga, um projeto cheio de elementos inesperados, reviravoltas e curiosidades.
Para contar a história da Joga, preciso antes explicar um pouco de mim e de como cheguei até ali. Minha história começa como a de muita gente: passei a infância tentando ser jogador de futebol, em categorias de base de alguns clubes, até ter o choque de realidade de que aquilo não era para mim. Foi quando resolvi frustrar meu pai e abandonar o futebol para estudar Ciência da Computação.
Os estágios da época, lá por 2005, não eram nada empolgantes, então decidi seguir estudando, fazendo mestrado e doutorado. Talvez aqui tenha sido o momento em que a sorte mais me favoreceu: acabei me especializando em IA quando ainda era pouco popular e me formando exatamente quando a área começou a explodir.

Sem interesse em carreira acadêmica, logo comecei a liderar uma equipe de IA na Chaordic, onde desenvolvíamos personalização para alguns dos maiores e-commerces do Brasil. Em quatro anos participei do crescimento, da venda para a Linx e da jornada de earnout. Esse foi um primeiro ciclo profissional e financeiro que possibilitou um próximo passo: empreender. Mal eu sabia o quanto eu ainda não sabia.
Fiquei um tempo pensando em como combinar meu conhecimento técnico com minha paixão pelo futebol. Observando o crescimento de apps como o Strava e o uso de GPS por jogadores profissionais, me veio aquele clique de ideia não convencional: já que todo mundo tem um smartphone com GPS, por que não criar uma experiência foda para jogadores amadores, semelhante à dos profissionais, usando o próprio celular nas costas?
O primeiro desafio era validar se tecnologicamente isso seria possível. Criei um aplicativo horroroso, diga-se de passagem, só para capturar o GPS do celular. Usei o telefone no bolso algumas vezes e consegui validar mapas de calor, distância percorrida, acelerações e outros indicadores. Logo pedi ajuda para minha mãe, que é costureira, para criar um colete justo com um bolso atrás do tamanho exato do celular. Para minha surpresa, usar o celular durante o jogo foi super tranquilo. Depois de poucos segundos eu nem sentia mais.

Chamei um amigo designer para criar a experiência e o visual, outro amigo para desenvolver, e depois de uma apresentação em um Meetup dois cientistas de dados pediram para participar do projeto. Assim nasceu, em 2017, a Joga+, que depois virou apenas Joga, porque internacionalmente o “+” não funcionava.

Vendíamos o colete online e oferecíamos o app como freemium. Vários early adopters surgiram, super empolgados, mas a retenção era baixa. Integramos a wearables e tivemos partidas monitoradas em mais de 100 países. Porém o dinheiro não duraria muito e decidimos entrar em uma aceleradora, focando agora em clubes profissionais, com uma plataforma integrada a wearables, um mercado em ascensão na época.
Chegamos a atender mais de 20 clubes profissionais no Brasil, mas o grande problema era o tamanho do mercado. Estávamos estudando o próximo passo quando a pandemia chegou e travou tudo. Por outro lado, as escolas de futebol precisavam de tecnologia para engajar alunos à distância e os pais buscavam atividades estruturadas. Foi aí que expandimos a plataforma com gamificação e engajamento para escolas, além de cobranças recorrentes e funcionalidades administrativas.
Essa fase nos levou a cerca de 150 escolas, mas percebemos algo importante: poucos profissionais realmente conseguiam usar a Joga para engajar e desenvolver alunos. A proposta de valor que realmente funcionava para as escolas era a cobrança recorrente. A gamificação ajudava no pitch comercial, mas na prática exigia muito de quem operava.
Esse foi o momento da virada. Começamos a refletir o quanto fazia sentido insistir na empresa. Já tinham sido quatro anos, pivotando entre amadores, profissionais e escolas, mas sem nenhuma tração excepcional. Além disso, continuar exigiria mais investimento e nosso cap table já estava bem diluído. Para completar, o boom do home office abriu oportunidades incríveis para talentos no Brasil, aumentando muito o custo de oportunidade dos funcionários.
Eu, pessoalmente, estava chegando à exaustão. Era uma batalha diária por um caminho promissor e por manter a equipe engajada em um sonho cada vez mais difícil de sustentar. Então me permiti ter conversas mais francas com empreendedores e investidores. Conectando os pontos, ficou claro que havia muito orgulho no que construímos, mas que fazia sentido encerrar o ciclo. Sem vergonha e sem perda de confiança entre colaboradores, investidores ou clientes.
Falamos com concorrentes, empresas do mesmo nicho, fabricantes de materiais esportivos que estavam expandindo para tecnologia. Havia conversas promissoras, mas percebi que seriam relacionamentos de longo prazo até chegar a qualquer acordo. Então comecei a conversar com empresas que teriam interesse no nosso time em um formato de aquisição por contratação (o tal do “acquihire”).
Em dois meses tivemos três boas ofertas, todas interessadas no time técnico, enquanto encaminhávamos uma fusão da equipe administrativa e comercial com outra startup de gestão de campeonatos amadores.
Aceitamos a oferta da Yalo, pioneira em comércio via WhatsApp, com presença forte na América Central e do Norte, e que buscava mais representatividade no Brasil para expandir seu mercado. No início de 2022, cinco anos após fundar a Joga, quatro de nós fomos para a Yalo nesse acquihire.
Tenho uma lista de aprendizados de todo esse processo, que vou compartilhar aos poucos por aqui. Mas talvez o principal seja que quando decidi empreender lá em 2016 eu realmente sabia muito pouco sobre o que vinha pela frente. E tudo bem. Não é um problema. Só esteja preparado e resiliente.
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thedeallab #1

